Cantigas de Amor e a Contemporaneidade


As cantigas de amor do trovadorismo são caracterizadas por possuírem a voz da narrativa masculina, idealizando a mulher amada numa relação de vassalo e senhora de acordo com as estruturas hierárquicas da época. O amor é tido como impossível e as cantigas são caracterizadas pela narração desse mundo distante do narrador e da mulher amada, como veremos na canção abaixo:

A dona que eu am’e tenho por senhor
amostráde-mi-a Deus, se vos en prazer for,
se non, dáde-mi a morte.

A que tenh’eu por lume destes olhos meus
e por que choran sempr’, amostráde-mi-a, Deus,
se non, dáde-mi a morte.

Essa que vós fezestes melhor parecer
de quantas sei, ai Deus!, fazéde-mi-a veer,
se non, dáde-mi a morte.

Ai Deus, que mi-a fezestes mais ca min amar,
mostráde-mi-a upossa con ela falar,
se non, dáde-mi a morte



Na cantiga, o eu lírico implora para que possa ser notado e possa se comunicar com sua amada. Nos versos, a idealização da mulher amada e a representação do mundo distante entre os dois ficam bem explícitos.

Fazendo uma relação com músicas contemporâneas, encontramos “Amor Platônico” da banda Legião Urbana:
 
Eu sou apenas alguém
Ou até mesmo ninguém
Talvez alguém invisível
Que a admira a distância
Sem a menor esperança
De um dia tornar-me visível
E você? Você é o motivo
Do meu amanhecer
E a minha angústia
Ao anoitecer
Você é o brinquedo caro
E eu, a criança pobre
O menino solitário que quer ter o que nao pode
Dono de um amor sublime
Mas culpado por querê-la
Como quem a olha na vitrine
Mas, jamais poderá tê-la
Eu sei de todas as suas tristezas
E alegrias Mas você nada sabes
Nem da minha fraqueza
Nem da minha covardia
Nem sequer que eu existo
E como um filme banal
Entre o figurante e a atriz principal
Meu papel era irrelevante
Para contracenar no final
No final
No final


Durante a narrativa o compositor deixa explícita a sua angústia pelo amor não correspondido. Apesar de não usar o termo “senhora” para se referir à amada, a apelação continua sendo direcionada a um ser feminino, como se observa nos versos “Mas culpado por querê-la” e “Mas jamais poderá tê-la”.



Fonte da imagem: Palavra e a imagem, outro (http://www.kawek.net/edinaldo_systemofadown-95274)
Fonte da cantiga: Cantigas Medievais Galego-Portuguesas (http://cantigas.fcsh.unl.pt/index.asp)
Fonte da letra: Amor Platônico, Legião Urbana (https://vagalume.com.br)

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